Para A.
A viagem seguia modorrenta
até que vi
no vidro da janela refletido
o rosto de um dos passageiros.
"Ei, é o A.", pensei comigo
apenas para em seguida lembrar
que há uns dois anos
A. estava morto.
Nunca fomos muito próximos,
A. e eu.
Mas quando perdi meu filho
ele deixou uma mensagem
dizendo que eu poderia procurá-lo
a qualquer hora
-qualquer hora, não importa!-
frisou na mensagem
quando eu precisasse.
Pouco tempo depois
ele próprio se foi.
Não me lembro de ter agradecido na ocasião.
Você sabe, estamos abalados, fora de órbita etc.
e só depois as coisas voltam
ao tempo próprio.
Acho que não agradeci na ocasião, portanto.
E tampouco poderei mais fazê-lo.
A. está agora, com meu filho, em outras paragens
acessível apenas em reflexos
fugidios em vidro espelhado.
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